12. De manhã, quando ela abriu o Facebook estava lá a
mensagem dele pedindo amizade. Depois de trinta anos, sentiu o mesmo palpitar
no coração, o mesmo arrepio na pele. Respirou fundo e apertou a tecla deletar.
13. Ao abrir o livro, cai um recorte de jornal: “Quem
encontra um amigo encontra um tesouro”. Volta a sua mente a imagem do pai, de
quem herdara o livro: alegre, risonho, bonachão, otimista, generoso, paciente.
“Isso era bem dele”, pensa instantaneamente. E sua atual solidão, sua vida
amarga, seu isolamento começam a pesar como se fossem uma traição ao que ele
sonhara para a vida de sua filha.
14.
Zapeando pelos canais de TV ela deparou com a imagem dele.
Tantos anos depois, a mesma fisionomia tranquila que esconde um vulcão
submerso, a mesma voz pausada e reticente, as mesmas mãos suaves em gestos
moderados, somente os cabelos encanecidos marcam a passagem do tempo. Sua voz,
alterada pelos instrumentos eletrônicos, traía um torvelinho interior que
somente ela poderia perceber e decifrar. Turbilhão que ela se negou a apaziguar
quando eram ainda muito jovens.
15.
Quando as cicatrizes do sofrimento já estavam quase curadas
ele telefonou. Tinham passado alguns meses de separação e ela já estava
voltando à tona, enfrentando a rotina, experimentando uma pouco de paz. Mas ele
telefonou e o redemoinho de emoções invadiu novamente toda a sua mente e o seu
coração. Voltava à estaca zero. Quase sem prestar atenção nas suas explicações
ela o aceitou novamente como sempre fizera.
16.
Em sua cadeira de balanço, as mãos jogadas sobre o colo, os
cabelos brancos amarrados em um coque na nuca, os óculos abandonados na mesa ao
lado, ela mentalmente calculou os anos
que tinham se passado desde que o conhecera. Eram mais de quarenta. Entretanto
sua imagem permanecia tão nítida e tão vívida como se não tivesse passado
nenhuma hora de seu último encontro.
Lucília Garcez
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